Peter Jackson traz ao público Get Back, um “Big Brother” com a maior banda de todos os tempos, mas não reescreve a história
Já se passou mais de uma semana do lançamento oficial dos três episódios do documentário Get Back, dos Beatles, dirigido por Peter “Senhor dos Anéis” Jackson.
Com isso, já foi possível ver e rever as mais de 6h de material e é possível escrever sem se preocupar com spoilers. Afinal, segundo a Disney, 154,8 milhões de pessoas já assistiram ao documentário.
Menos sombrio
Como não poderia de ser, todos os episódios trouxeram uma narrativa nenos sombria do que aquela apresentada na versão original do filme Let it Be.
Porém, isso não era uma tarefa das mais difíceis — esperamos que uma versão restaurada seja lançada junto com o box que deve trazer uma edição estendida da série disponibilizada no Disney+.
Muito material inédito e emoção garantida
O filme Let it Be tinha menos de duas horas de duração e o novo Get Back tem mais de seis horas. Isso significa que a maior parte do material apresentado é inédito para fãs de qualquer nível de conhecimento.
Ou seja, a emoção é garantida para todos!
Ainda é importante lembrar que todo o material filmado (mais de 50 horas) e gravado (mais de 150 horas) ficou guardado por 50 anos nos arquivos da Apple (a dos Beatles, e não a de Steve Jobs) passou por uma meticuloso trabalho de restauração.
O melhor e o pior de cada episódio
Dito isso, vamos ao que pode ser considerado o melhor e o pior da série.
Parte 1: Twickenham
Prós:
- A ideia da banda de voltar aos palcos com material inédito;
- O minucioso trabalho de restauração do som e da imagem, que permitiram que performances pouco inspiradas e bate-papos captados com pouca clareza pudessem se transformar em um material palatável;
- Ver o processo criativo dos quatro Beatles, com destaque para Paul e o surgimento da canção “Get Back”;
- A enorme quantidade de canções mostradas pelos Beatles e que seriam utilizadas no disco Abbey Road e em suas carreiras solo,
- A importância e eficiência de Mal Evans para a banda;
- A gravação da conversa entre John e Paul sem que eles soubesses que estavam sendo gravados;
- O fim do mito de que a discussão entre Paul e George foi intensa e causou a saída do guitarrista da banda;
- A confirmação de que eles sabiam que o clima não estava bom e que uma separação era algo bastante possível,
- O resgate de várias canções da fase pré-beatle.
Contras:
- A falta de entusiamo de todos, exceto Paul McCartney;
- O esquema mambembe da produção do documentário/filme. Não havia iluminação, acústica, equipamento de gravação de som ou qualquer tipo de conforto para os músicos;
- O horário das filmagens (pela manhã), que acabou com uma vasta quantidade de “Beatles sonolentos;
- O mau-humor de George Harrison (na maioria das vezes sem razão);
- O estado de John Lennon (bastante drogado e “fora do ar”);
- A falta de registro da briga entre John Lennon e George Harrison, que foi a verdadeira razão para que Harrison deixasse a banda;
- A total indisciplina dos Beatles e a falta de uma definição sobre o que fariam (show? Filme? Especial de TV?),
- O excesso de conversas, muitas delas sem muito conteúdo.
Parte 2: Apple
Prós:
- O entusiamo de George Harrison na volta ao grupo, inclusive sugerindo o lançamento de “Get Back” como single, mesmo com as reticências de Paul McCartney;
- A “parceria” dos Beatles na finalização de canções como “Something”, “Get Back” e “Octopus’s Garden”;
- A chegada de Billy Preston, trazendo leveza e outro som para as canções que estavam sendo ensaiadas (os primeiros takes de “Don’t Let Me Down” mostram isso);
- O maior envolvimento de George Martin no projeto,
- A oportunidade de ver as gravações dos takes que foram utilizados no disco Let it Be.
Contras:
Ver que os Beatles nem sempre se cercavam de pessoas confiáveis, como o tal Magic Alex, que deveria ter preparado o estúdio de gravação na sede da Apple,
A verdadeira bagunça que foram as gravações.
Parte 3: Show do telhado
Prós:
- A finalização de várias canções;
- Ringo soltando um “pum”;
- A certeza de que pertubariam a paz e a presunção de que poderiam ser presos (o que não seria possível por serem MBE);
- A maneira como os funcionários da Apple tentaram enrolar e aborrecer os policiais que foram até o prédio por conta das reclamações pelo som alto;
- As entrevistas feitas com moradores de Londres durante o show do telhado,
- O show do telhado na (quase) íntegra.
Contras:
- A indefinição sobre tocar ou não para uma plateia;
- Ringo soltando um “pum”;
- A falta da cena de um velhinho inglês subindo as escadas de incêndio de um prédio para ver o show,
- As cenas de gravação das canções “The Long and Winding Road”, “Let it Be” e “Two of Us”, que são mostradas durante os créditos.
Balanco final
No fim das contas, Jackson mostra uma banda cheia de contradições, que se respeitava e, ao mesmo tempo, já não tinha muita paciência uns com os outros.
Get Back não reescreve a história dos Beatles em janeiro de 1969. Eles não se separaram por causa do projeto, — ainda gravariam o LP Abbey Road e discutiriam planos para mais um single e outro LP — mas já davam mostras nítidas de que o fim estava próximo.
Há muitos outros detalhes que poderiam entrar nessa lista. Deixa sua opinião nos comentário e, quem sabe, não incluímos a sua sugestão no texto.
Personagens “extras”
Além de Mal Evans, já citado anteriormente, dois outros “personagens extras” merecem um destaque: Yoko Ono e Michael Lindsay-Hogg.
Yoko Ono — A “ainda não” esposa de John Lennon foi uma personagem importante e falante durante aquele janeiro de 1969. Porém, na edição de Peter Jackson (provavelmente a pedidos) ela aparece praticamente muda, o que ajuda a tirar o peso da sua influência no mal-estar da banda.
Ponto para todos!
Michael Lindsay-Hogg — Responsável pelas filmagens e a edição do filme Let it Be e de tudo o que vemos no documentário Get Back — se tornou Sir, mas era uma mala sem alça daquelas bem grandes e teve quase todas as suas ideias rejeitadas.
Uma versão deste texto foi publicada na Revista Ambrosia.