Paul McCartney repaginou a sua Disneylândia musical nesse giro 2013 pelo Brasil. O show da noite do sábado (4 de maio) no Mineirão, em Belo Horizonte, levou os mais de 52 mil fãs presentes, muitos deles constituídos de pais que levaram seus filhos para conhecer o dono – pelo menos intelectual – de um dos maiores e mais amados catálogos musicais de todos os tempos. E quem esteve lá não se decepcionou. Paul, que subiu ao palco poucos minutos antes do horário previsto, 21h30, manteve a estrutura de suas últimas turnês, misturando canções dos Beatles, Wings e da carreira solo, todas amplamente conhecidas e cantadas a plenos pulmões por uma platéia, mas mostrou suas armas logo na primeira canção da noite, Eight Days a Week, que só havia sido tocada ao vivo uma vez pelos Beatles e nunca por Paul em sua carreira solo*- *essa informação foi divulgada até no site oficial do Paul, mas juro que nunca vi essa performance. Lembro apenas deles dublando a música em um programa de TV -, mas essa era apenas a primeira surpresa da noite!
Hipnotizada pelo carisma e simpatia de um artista que faz questão de agradecer sempre, demonstrar a sua satisfação e ainda binda os locais com palavras e frases tipicamente mineiras – “Povo bão” e “Ê trem bão, sô”, por exemplo – o público foi brindado com várias novas canções, algumas delas tocadas pela primeira vez em qualquer lugar do planeta, como os casos de Your Mother Should Know, All Together Now, Being For The Benefit Of Mr. Kite e Lovely Rita, além de resgatar algumas canções que não eram interpretadas faz muito tempo, algumas delas esquecidas por mais de 30 anos, como Hi Hi Hi, Listen to What the Man Said e Another Day (que foi tocada pela última vez em 1993). Uma mudança de quase 1/3 do repertório das apresentações anteriores no país, um recorde em termos de Paul McCartney, que ainda tem algumas canções ensaiadas e guardadas na manga para os próximos shows. Mas, apesar de sua turnê Out There ser totalmente nova – alguns elementos, são similares a Up and Coming e On the Run, que passaram pelo Brasil em 2010, 2011 e 2012 – Paul surpreendeu. O palco, apesar de contar com uma plataforma que subia vários metros levando Paul literalmente as alturas, era distribuído de maneira similar, permitindo ao músico se dividir entre baixo, guitarra, violões e pianos com naturalidade. As novas canções funcionaram perfeitamente e trouxeram um ar de novidade para brinquedos que são mais que manjados mas que todos adoram, como Hey Jude e Yesterday.
– Foi emocionante. Todas as vezes ele consegue fazer trazer algo novo que acaba nos deixando com um sorriso involuntário no rosto – disse Francisco Henrique Ribeiro, veterano de 12 shows de McCartney e que viajou do Rio para acompanhar mais essa apresentação.
A turnê de Paul McCartney segue ainda para Fortaleza, onde o ex-beatle se apresenta na quinta-feira, dia 9. Fica a torcida para que o músico continue vindo ao Brasil e resolva repetir o histórico concerto que realizou em 1990 no Maracanã, quando 184 mil pessoas lotaram o estádio, colocando o evento até mesmo no Livro dos Recordes.
Mantendo o legado Beatle, Paul McCartney surpreendeu com as mudanças no repertório. Não mostrou nenhuma canção do novo disco – que será lançado ainda este ano – e usou como base para as novidades o período mais psicodélico dos Beatles, entre 1967 e 1968. Dessa época o músico buscou de seu catálogo canções como Your Mother Should Know, All Together Now, Lovely Rita e Being For The Benefit Of Mr. Kite (essa do eterno parceiro John Lennon). Os outros números que debutaram em Belo Horizonte foram pinçadas da sua carreira solo e do seu período com os Wings, com destaque para a versão de Hi Hi Hi, fiel ao compacto e bastante diferente da tocada em 1976.. As escolhas foram certeiras, pois além de surpreenderem, mostraram total compreensão de como dominar uma platéia.
Depois de Ob-La-Di, Ob-La-Da e Mrs. Vandebilt – canções que estão longe de serem obras primas, mas que se tornaram preferidas do público – é a vez da simpática bobagem musical All Together Now cair nas graças do público. Com uma letra inofensiva, mas um refrão que sugere a participação de todos, a canção acabou sendo um dos pontos altos da apresentação de Paul. Segundo as más línguas, McCartney ainda teria mais surpresas preparadas para suas próximas apresentações.
*Confira os vídeos de algumas das novas canções apresentadas por Paul em primeira mão no Brasil
** Eight Days a Week
Junior’s Farm
All My Loving
**Listen to What the Man Said
Let Me Roll It
Paperback Writer
My Valentine
1985
The Long and Winding Roa
Maybe I’m Amazed
Hope of Deliverance
We Can Work It Out
**Another Day
And I Love Her
Here Today
**Your Mother Should Know
Lady Madonna
**All Together Now
Mrs. Vandebilt
Eleanor Rigby
**Being For The Benefit Of Mr. Kite
Something
Ob-La-Di, Ob-La-Da
Band On The Run
**Hi Hi Hi
Back In The USSR
Let It Be
Live And Let Die
Hey Jude
Bis
Day Tripper
Lovely Rita
Get Back
Bis II
Yesterday
Helter Skelter
Golden Slumbers/Carry that Weight/The End
Imagina na Copa
Mas nem tudo foi festa e alegria. O Mineirão voltou a apresentar vários problemas e até mesmo o som do espetáculo deu uma rateada, falhando durante as canções Ob-La-Di, Ob-La-Da e Band On The Run. Quem chegou antes das 17h encontrou um ótimo esquema de trânsito e tranqüilidade do lado de fora do estádio, nenhum cambista ou camelô. Porém, essa situação foi mudando a medida que a hora do show se aproximava.
A primeira reclamação foi por conta da falta de ordem das filas, com muita falta de informação por conta da organização e falta de educação do público, que teimava em furar fila, protagonizando episódios que só terminaram com a intervenção da polícia. Depois, a constatação de que esqueceram de pensar na iluminação do entorno do Mineirão. Por volta das 18h já era praticamente impossível enxergar algo com clareza e os poucos postes com lâmpadas se mostraram totalmente insuficientes – um convite aos ladrões. Dentro do estádio, as mesmas reclamações dos eventos anteriores: banheiros insuficientes, sem água, comida cara e, para piorar, um encanamento de esgoto estourou, deixando parte de um dos corredores impraticável, literalmente na merda. Na saída, outro caos. O trânsito deu um nó e um percurso de pouco mais de 15 minutos se transformou em uma maratona de mais de 1h30. As autoridades terão muito trabalho para superar essas deficiências ou o bordão “imagina como vai ser na Copa” vai ser mais do que adequado.
Além dos problemas relatados no parágrafo anterior, fica também a constatação de que a rede hoteleira também precisa se preparar melhor. O pós-show foi um avanço ao bar do hotel onde estava, que fechou mais cedo já que todos os produtos comestíveis foram devorados pelos fãs mais famintos e mais rápidos. Sobrou o velho e bom podrão!
Fãs sortudos e endinheirados pagam caro e assistem ao ensaio antes do show
Se os preços dos ingressos normais para os shows de McCartney no Brasil já não são muito baratos – entre R$ 150 e R$ 600 – o que pensar em pagar mais de US$ 1,5 mil? Esse é o preço que se paga pelo pacote Hot Sound que dá o privilégio de, além de chegar mais cedo e almoçar um cardápio vegetariano especialmente preparado para esses abastados, assistir ao soundcheck (passagem de som) que Paul e a banda fazem antes das apresentações. Nesses pequenos shows particulares (nunca para mais de 250 pessoas e que duram entre 40 minutos e 1h30) McCartney toca canções que normalmente não fazem parte do repertório da apresentação que fará a noite e não economiza a garganta. Não são poucos os rocks e canções gritadas executadas por ele (Blue Suede Shoes, Birthday e Honey Don’t, são figurinhas fáceis nos soundchecks).
– Durante o show, sem dúvida é emocionante ouvir o Paul cantar músicas lendárias como Yesterday e outros grandes clássicos. Mas ainda que o som esteja perfeito, existem aproximadamente 60 mil pessoas gritando, chorando, falando e cantando. Na passagem de som, a sensação de ouvir o som de forma extremamente limpa e clara, é fenomenal. Isso sem falar na interatividade com o público, que sem dúvida é muito maior.”, explica o economista Raphael Xavier Gomes Alves, de 26 anos, um veterano de cinco hotsounds.
Outra possibilidade que atrai os fãs é a chance de Paul chamar alguém para cantar com ele no palco alguma canção ou aceitar a sugestão de alguém da plateia e cantar uma música específica.
– O momento mais marcante ocorreu no dia 22 de maio de 2011, aproximadamente às 16h30, quando, após ler o cartaz que eu estava segurando, O Paul olhou pra mim e disse: “Ok, vou tocar para você então, ok? Para você…” e começou a tocar Ebony and Ivory, que estava escrito no meu cartaz. Como se soubesse que eu estava duvidando que aquilo estava acontecendo, logo após terminar a música ele disse “Foi pra você, ok? Pra você!”. Eu fiz um sinal de “Ok” com a mão e aplaudi”, conta Raphael.
Mas, mesmo tendo bala na agulha para pagar mais de R$ 3 mil por um ingresso fica a dúvida: vale a pena?
– Sem dúvida. Depois de ir pela primeira vez em Porto Alegre (2010), resolvi repetir a loucura em 2011, quando ele foi tocar no Engenhão. Um amigo meu, que, como eu coleciona discos e vídeos de Paul McCarney e que tem bem mais dinheiro que eu, me ligou dizendo que era um absurdo gastar tanto dinheiro para ver mais 1h de apresentação. Expliquei que foi o dinheiro mais bem gasto da minha vida e que essa era uma extravagância que alguém que coleciona a música de Paul por mais de 30 anos pode ter. No fim, ele foi e ainda levou a filha e a irmã”, diz um outro veterano de soundcheks que preferiu não ter seu nome divulgado.
Para quem não pôde ou pode bancar essa extravagância (que é vendida apenas através do site do próprio McCartney), fica o registro do que ele tocou em Belo Horizonte.
Soundcheck (Belo Horizonte)
Blue Suede Shoes
Got To Get You Into My Life
Sing The Changes
Let ‘Em In
Calico Skies We Can Work It Out
Eight Days A Week
Being For The Benefit Of Mr. Kite
Lovely Rita
Another Day
Hope Of Deliverance
Listen To What The Man Said
Hi Hi Hi
All Together Now
Your Mother Should Know
Blackbird
Fotos: Marcos Hermes e Pedro Carrilho/Divulgação
Vídeos: Jo Nunes
Uma versão editada desse texto também foi publicada no jornal O Fluminense
Volta logo, Paul!