Grupo, hoje reduzido uma dupla, lança registro ao vivo e coloca a obra dos Monkees entre as melhores do pop dos anos 60
Os Monkees são um caso único na história do pop-rock. Formado por quatro atores/músicos — os americanos Micky Dolenz, Michael Nesmith e Peter Tork, e o inglês Davy Jones — o grupo estrelou uma popular série de TV meio que parodiando os Beatles, venderam milhões de discos e tem no catálogo alguns dos clássicos dos anos 60.
Agora, já sem a presença de Jones e Tork (mortos em 2012 e 2019, respectivamente) os membros restantes lançam o melhor (e em muitos aspectos, o primeiro) disco ao vivo. “The Monkees Live — The Mike & Micky Show“ (Rhino Records) é uma experiência imperdível para quem conheça ou não a obra do grupo.
Nostalgia e qualidade
Quem (de qualquer idade) nunca tiver ouvido canções como “Last Train to Clarksville”, “Pleasant Valley Sunday”, “Daydream Believer” e “I’m a Believer” (será que alguém não viu Shrek?), não deve gostar de música e, mesmo assim, é improvável não conhecê-las.
Quem também nunca tiver visto/ouvido o tema de abertura da série de TV precisa se reciclar em termos de história musical.
O novo álbum traz todos os principais sucessos, a maioria deles tocada nos seus tons originais, comprovando a boa forma vocal dos dois Monkees sobreviventes, especialmente Dolenz.
São 25 canções executadas quase que fielmente aos arranjos originais. A “limpeza” e clareza do som (e das performances) pode tirar um pouco da alegria e espontaneidade que poderíamos esperar de um registro ao vivo, mas o resultado acaba sendo mais que positivo.
Desde o número de abertura — “Last Train to Clarksville”, que, por acaso, foi o primeiro hit do grupo — até a última canção — “I’m A Believer” — o ouvinte é levado de volta para a época mais fértil da música (pop/rock) de todos os tempos.
A banda que acompanha os dois astros é de primeira e conta com rostos bem conhecidos para os dois, tornando o espetáculo “bem família”.
Tirando os sucessos conhecidos, fica a boa surpresa de ouvir canções como “Me & Magdalena”, “Porpoise Song” e “Tapioca Tundra”. Porém, fica o protesto pela não inclusão da música tema do seriado, que por alguma razão é sempre deixada de fora. Isso acontece até mesmo nos shows solo de Dolenz.
Versões acústicas e humor
Mas, se a maioria das canções é fiel ao registro contido nos discos originais, Micky & Milke separaram algumas “surpresas”. A melhor delas é a inclusão de um mini set acústico com as canções “Papa Gene’s Blues” e “Randy Scouse Git”.
As duas novas roupagens caíram bem e deram outro sabor às músicas e dando um certo frescor ao novo disco.
Apesar de uma certa assepsia nas performances, uma vez ou outra um suspiro de espontaneidade. O melhor exemplo disso é quando Nesmith diz: “Eu nunca gostei tanto de trabalhar com alguém como gosto de trabalhar com Micky”. Nessa hora, Dolenz ri e rebate: “Eu também nunca gostei tanto de trabalhar com alguém como gosto de trabalhar comigo mesmo”.
Homenagens aos ex-companheiros
Outro ponto de destaque são as lembranças e homenagens feitas aos ex-companheiros Jones e Tork.
Apesar de Jones praticamente não ser citado (apenas algumas músicas onde era o vocalista são executadas) — o que aumenta a impressão de que ele realmente não era a figura mais popular dentro da banda — ele, que era o queridinho das jovens fãs, ainda é uma peça fundamental no sucesso do grupo.
PS: Essa impressão de que Jones não era muito popular entre os companheiros se aplica principalmente a Nesmith, que praticamente não participou de nenhum show onde Jones estivesse presente em todas as várias encarnações dos Monkees.
“A Little Bit Me, A Little Bit You” e “Daydream Believer” provam a força de Jones. A última, inclusive, um das mais populares canções do repertório dos Monkees, ganha um belo (e merecido) coro do público.
Já Peter Tork é lembrado com a ótima “For Pete’s Sake” (do álbum Headquarters), uma homenagem ao movimento hippie, cheia de paz e amor e cujo verso inicial deu título a sua ótima biografia escrita por Sérgio Farias (Love is Understanding).
Livro recoloca os Monkees na elite do pop-rock
Para ouvi sem parar
The Monkees Live – The Mike & Micky Show é daqueles discos que deixam a sensação de que poderiam ter o dobro da duração e que o lançamento de um registro em vídeo seria muito bem vindo.
Mas, enquanto temos apenas o áudio nas plataformas de streaming e em CD — a versão em vinil será lançada em 15 de maio — ouça e seja transportado para uma época bem mais criativa no cenário pop/rock.
Se você não balançar o corpo ou pelo menos a cabeça ouvindo “Mary, Mary”, “I’m Not Your Steppin Stone” ou “Last Train to Clarksville”, você é ruim da cabeça ou doente do pé.
Ah, torça para que eles estejam indo para a sua cidade.
Cotação: ****
Mais discos vendidos que os Beatles e os Stones
Muitos acham que é lenda — o próprio Nesmith diz que é uma história inventada por ele —, mas os Monkees venderam mais discos que os Beatles e os Rolling Stones juntos! Bem, pelo menos em 1967 e nos Estados Unidos.
A verdade é que os Beatles passaram boa parte de 1967 gravando o que viria a ser o LP Sgt. Pepper’s e os Stones não eram campeões de venda.
Enquanto isso, os Monkees tiveram quatro (4) LPs no topo das paradas — The Monkees (outubro de 1966), More of The Monkees (janeiro de 1967), Headquarters (maio de 1967) e Pisces, Aquarius, Capricorn & Jones Ltd. (novembro de 1967).
Esse cenário nos leva a crer que a informação é verdadeira, até porque nunca foi desmentida por nenhum órgão de aferição de vendas. Foram mais de 75 milhões de discos vendidos ao redor do globo.
O ritmo dos lançamentos é algo que pode parecer surreal para os dias de hoje, mas nem era tão absurdo, se contarmos que até os anos 1970, lançar dois discos por ano (fora os singles) era coisa comum.
Vale sempre lembrar que eles eram tão populares que o artista que abria os seus shows era um tal Jimi Hendrix!
Controvérsia estúpida
A maior crítica aos Monkees é que eles era um grupo fabricado e que não tocavam os instrumentos nas suas gravações. Isso não era um problema nos Estados Unidos. A grande maioria dos artistas e grupos de rock tinha seus discos gravados por músicos de estúdio, principalmente os membros da chamada Wrecking Crew.
Esse grupo de músicos, que revelou uma série de nomes que viraram lendas e alguns que até se destacaram como estrelas de brilho próprio (Leon Russel e Glen Campbell, por exemplo), foi o responsável por praticamente todos os sucessos pop da década de 60.
Muita gente pode não saber, mas o som de sucessos dos Beach Boys, Frank Sinatra, Simon & Garfunkel, Byrds, Phil Spector, Dean Martin, The Mammas & The Papas e até mesmo Elvis foi gerado por músicos de estúdio e não pelos astros que estampavam as capas dos LPs.
Portanto, os Monkees não tocarem seus instrumentos durante as gravações não seria nada demais se eles mesmos não tivessem tornado esse fato público, já que nenhum fã sabia dessa prática, que não era comum na Inglaterra, por exemplo.
Essa fama de “grupo fabricado” foi um dos motivos para que a banda fosse sempre considera de segunda categoria por muitos críticos e até mesmo músicos da época.
Pior, depois de reclamarem que queriam tocar nos discos, os membros da banda passaram a contratar os serviços da Wrecking Crew. Vá entender!
Até hoje eles mesmo parecem sempre ter uma atração pelo auto boicote, com declarações que nem sempre parecem inteligentes, mesmo que temperadas com alguma dose de humor.
Afinal, dizer que “chamar os Monkees de um a banda é o mesmo que dizer que o Leonard Nimoy se transformou no Sr. Spock”, não parece um elogio, não é mesmo, Sr. Dolenz?
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