Grupo lança o quarto disco da carreira e aposta em repertório 100% autoral. Banda faz show em Niterói no dia 19 de novembro e diz querer tocar mais na cidade
São dez anos de carreira. Dez anos de samba, choro e de um movimento que resgatou a raiz de um dos ritmos que definem a identidade musical do Rio e do Brasil. Assim como a Bossa Nova, o samba tem como seu berço mais importante a Cidade Maravilhosa, e a Lapa acabou se transformando em cenário onde apareceram novos expoentes de gênero. Foi assim com Daniel Montes (violão), Gabriel Azevedo (voz e pandeiro), João Cavalcanti (voz e tantan), João Fernando (bandolim) e Rafael Freire (cavaquinho), cinco jovens da Zona Sul do Rio que se juntaram para iniciar uma jornada musical que já conta com três CDs (Casuarina (2005), Certidão (2007) e MTV Apresenta: Casuarina (2009), além de um DVD (MTV Apresenta: Casuarina). Com o lançamento hoje do seu mais novo trabalho (Trilhos/Terra Firme – Universal Music) no Teatro João Caetano, o grupo se aventura pelo terreno autoral.
“Esse disco é 100% autoral. Depois de lançarmos o MTV Apresenta (2009), onde praticamente todas as canções eram clássicos do samba, decidimos mostrar ao público que nos conheceu através desse projeto esse nosso outro lado”, explica Gabriel Azevedo, um dos vocalistas do grupo.
O disco mantém a mesma sonoridade que marca a carreira do grupo, mas com algumas sutis diferenças.
“Os arranjos estão mais limpos. Nós amadurecemos e vimos que nem sempre precisamos complicar as coisas. O álbum foi gravado e produzido pela mesma equipe que nos acompanha desde a estreia, mas o fato das canções serem todas inéditas, sempre com a autoria de um dos componentes, também mudou um pouco o processo. Afinal, são cinco opiniões diferentes”, diz Gabriel.
A carreira, que já conta com shows em lugares distantes e nem sempre no itinerário de sambistas (Angola, Bélgica, Eslovênia, Espanha, França, Holanda, Inglaterra, Israel e Suécia) e alguns prêmios importantes (Melhor Grupo de Samba do Prêmio da Música Brasileira, em 2009, além de indicações ao PMB (então Prêmio Tim) e ao VMB), entra agora na fase de consolidação junto ao grande público.
“Esperamos conquistar um público que não é tão familiar ao nosso trabalho. Para isso, até criamos uma loja virtual que vende todo o nosso material (CDs, DVDs e até camisetas). Grande parte da nossa venda é realizada durante os shows.
A gente ainda aposta nisso: que as pessoas gostam de comprar CDs e gostam de ler encartes, saber quem toca o que, etc”, revela Gabriel.
Cheios de histórias
Em Trilhos/Terra Firme os membros do Casuarina aproveitam para fazer uma série de canções que acentuam o caráter autoral, cheios de histórias. É assim com Qual Maneira (Daniel Montes e Roberto Lara), um chorinho que narra, com boas pitadas de humor, um pouco da vida do trabalhador do Rio, a animada Samba de Helena (Gabriel Azevedo), inspirada na filha mais nova do autor ou Fulô de Caju (João Cavalcanti e Alfredo Del Penho). João Cavalcanti – filho de Lenine, que coincidentemente também está lançando disco novo – é o responsável por um dos melhores momentos do disco com a alegre Dissimulata, que fala de uma mulher que costuma arrebatar paixões pelas pistas de dança das gafieiras da vida. Entretanto, é Vaidade (parceria inédita entre os vocalistas Gabriel e João), a faixa que mais chama a atenção. Não só pelo tema – um acerto de contas com uma vaidosa mulher e que termina com uma reconciliação – como pela levada envolvente. “Carinho nunca é demais, vaidade nunca é de menos”, diz a letra.
Todos os elementos que tornaram o Casuarina um dos mais importantes grupos da sua geração estão no novo trabalho.
Os arranjos elegantes, os vocais inspiradamente afinados, aliados a um instrumental tradicional do samba, além das canções inéditas, dão um frescor especial a Trilhos/Terra Firme. As diferentes vertentes musicais dos integrantes parecem contribuir para a unidade do grupo, ao invés de ser um elemento de tensão.
“Nossas influências são as mais diversas possíveis. O João Cavalcanti foi ao Rock in Rio todos os dias. O som do seu pai (Lenine) o influenciou muito. Eu ouço mais música brasileira e jazz. O Daniel Montes gosta muito de Michael Jackson, Stevie Wonder e todo o som produzido pela Motown. Acho que isso que dá um molho diferente ao nosso som e em momento algum traz divergências. O João está gravando um disco solo, mas com uma sonoridade que segue um caminho totalmente diferente do nosso. A coisa é tão bacana que o Casuarina vai estar presente em uma faixa”, explica Rafael Freire.
Mesmo com os dez anos de estrada, o Casuarina não parece sofrer do tédio e problemas internos que afligem a maioria dos grupos musicais. A pluralidade de idéias e influências, unida ao respeito pelos gostos pessoais, parece fortalecer o grupo, que não se surpreende com o tempo em que estão juntos.
“Já esperávamos ficar juntos por bastante tempo e não vemos porque não seguir em frente. Talvez até mesmo as diferenças de personalidade ajudem nesse relacionamento. Nós descobrimos que poderíamos mesmo durar depois da nossa primeira turnê pela Europa (2004). Nem tínhamos gravado o primeiro CD e ficamos 27 dias dormindo no sótão de uma casa em Amsterdã (Holanda), tocando somente em pequenos bares e pubs. Esse período serviu para nos conhecermos melhor e sedimentar a amizade do grupo”, conta Gabriel.
Grupo gostaria de tocar mais em Niterói
O público de Niterói poderá conferir as canções de Trilhos/Terra Firme no dia 19 de novembro, quando o grupo se apresenta no Bar do Meio. Antes, se apresenta em Cuba e em vários estados brasileiros. Mesmo com um show marcado, o grupo se ressente de mais apresentações na cidade.
“Gostaríamos de fazer mais shows em Niterói. Recebemos muitos pedidos de fãs por e-mail e pelas redes sociais, mas acho que falta um pouco de iniciativa dos empresários. Precisamos de mais convites”, lamenta Gabriel.
Nos shows da nova turnê, o Casuarina pretende mesclar sucessos dos discos anteriores com as novas canções.
“Claro que temos vontade de tocar as novas composições, mas não tem como deixar de lado as músicas que fazem parte da nossa história. Até mesmo alguns dos clássicos gravados no MTV Apresenta farão parte do novo espetáculo.
Esperamos que o público goste tanto desse novo repertório quanto nós estamos gostando de tocá-lo”, adiantam os integrantes.
Para os fãs do bom samba de raiz e do choro de qualidade, Trilhos/Terra Firme é um disco que tem tudo para agradar. As 14 canções que compõem o trabalho passeiam por temas diversos e que expandem o espectro musical do Casuarina. No fim das contas, tudo soa novo, mas com um toque de familiaridade que define os grandes trabalhos dos grandes artistas.
Texto originalmente publicado no jornal O Fluminense