Zeca Pagodinho canta clássicos do samba

DVD Zeca PagodinhoNão é fácil falar sobre Zeca Pagodinho. São muitas as facetas desse suburbano carioca que se transformou em um dos maiores nomes do samba das últimas décadas e que deve entrar para a história como um dos ícones do gênero em todos os tempos. Agora, chegando aos 30 anos de carreira, Zeca decidiu homenagear os sambas que ouvia quando era criança e que o inspiraram a entrar no mundo do samba, lançando o CD/DVD Multishow Ao Vivo – Zeca Pagodinho 30 Anos Vida que Segue.

Na entrevista coletiva de lançamento do projeto, em um hotel da Barra da Tijuca, o sambista chega de mansinho, fala com todos (jornalistas, funcionários do hotel e gente da gravadora), sem cerimônia ou qualquer tipo de afetação.

“Ainda não é um balanço de 30 anos da minha carreira. Esse trabalho é sobre quando comecei a minha paixão pelo samba e pela música brasileira. Eu estou cantando a carreira de outras pessoas”, explica o sambista.

A receita é infalível: misture um grande intérprete cantando clássicos da leva de Sinhô (Gosto que me Enrosco), Candeia (Preciso me Encontrar), Zé Keti e Elton Medeiros (Mascarada), Jamelão (Agora Eu Sou Feliz) Paulinho da Viola (Foi um Rio que Passou em Minha Vida) e Noel Rosa (Vem Chegando a Madrugada), entre outros gênios, acrescente convidados ilustres como Marisa Monte, Yamandu Costa, Paulinho da Viola, Xuxa e membros da Velha Guarda da Portela, e tenha um produto de primeira. Inclua um making of e confirme que toda a descontração do palco não é jogo de cena.

“O Max (Pierre) me disse: por que você não convida as pessoas que você gosta e admira? Concordei e disse: “deixa que eu mesmo falo com cada um”, conta sobre a escolha dos convidados.

Mas como é ser referência e ídolo para os sambistas da nova geração?

“Procurei fazer o melhor e trabalhar com os melhores para deixar o melhor. Quem viveu na época da minha mãe vai curtir e relembrar ao ouvir o disco e a garotada vai conhecer. A gente tomou o cuidado de fazer mais ou menos parecido como era. Não gosto de modernizar muito, para que essa música passe para a outra geração assim como passou para mim”, argumenta.

E o clima é totalmente família. Todos os músicos são amigos de Zeca, muitos deles desde antes do cantor se tornar um nome conhecido.

“Todo mundo tem que trabalhar, eu sou fã de todo mundo e todo mundo tem que estar perto de mim. São 20 músicas? Então um toca três, o outro toca duas e assim todo mundo fica feliz da vida. A gente não se conheceu no palco. Todo mundo se conheceu no botequim, no morro e, só no olhar, você já sabe quem vai entrar. É todo mundo compadre, não tem a aquela coisa do artista e dos músicos, mas, na hora de tocar, tem de tocar. Não pode jogar água fora da bacia”, dispara.

Mas família é algo sério e ainda capaz de deixar o experiente Zeca inseguro.

“O olhar da minha mãe é daqueles que reprova e, por isso, eu deixo ela lá atrás, para não me grilar. Tem sempre o perigo de errar e isso é chato. Para cantar Mascarada, por exemplo, eu tive que tomar Lexotan. A Mônica (esposa de Pagodinho) disse pra mim: ‘tira essa música. Em 25 anos eu nunca vi você tomar calmante por causa de uma música’. Fui do Rio até Búzios ouvindo para aprender. Meus filhos não aguentavam mais, mas, na hora, saiu de primeira”, conta.

Como se já não bastasse o seu genuíno jeitão de malandro carioca, daqueles do bem – cantados por Chico Buarque e personalizados por figuras como Moreira da Silva -, Zeca  conseguiu mais visibilidade ainda ao ajudar as vítimas das enchentes em Xerém, na Baixada Fluminense, onde viveu boa parte de sua vida. Tudo isso sem nenhum interesse que não apenas o de diminuir o sofrimento de amigos e vizinhos.

“Rapaz, lá não tinha nada. Agora, ficou nada menos que 50. Está sendo feito o mínimo. É aquela velha história: muita coisa põem na culpa de um ou na culpa de outro. Tá lá a pontezinha do mesmo jeito. Deram um improviso, mas até agora nada. A ponte de trás qualquer dia cai também. É complicado. A ponte de ferro está quebrada e uns dizem que é do (governo) federal, outros que é do estadual e outros do municipal. Eu sei é que tem gente ficando rico às custas da desgraça alheia. Eu fiz a minha parte, como sempre faço”, analisa.

A irreverência e sinceridade do cantor, que é daqueles que olham no olho e falam a verdade, sem frescuras, não deixam dúvidas de que a sua praia é o samba e que nem mesmo a possibilidade de participar de grandes eventos o seduz. Ao ser perguntado se aceitaria participar da abertura ou do encerramento das Olimpíadas do Rio, por exemplo, cai na gargalhada antes de disparar:
“Com essa pinta de atleta? Tá de sacanagem? Tá maluco? Deixa eu vendo só pela televisão que já está ótimo”, brinca.

Melhor mesmo deixá-lo fazendo o que sabe de melhor, da maneira que sabe melhor e onde se sente mais confortável.

Ave Zeca!

Uma versão desse texto também foi publicado no jornal O Fluminense

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